quinta-feira, 21 de novembro de 2013

A Carta de Carolina Ruão

Carolina Ruão

A Carta


Há uns tempos atrás, Carolina Ruão veio fazer-nos uma visita. Foi um prazer tê-la connosco como poderão ler AQUI. Para agradecer a sua presença, os alunos do 9ºB escreveram uma carta a Carolina. A resposta não tardou.
Amigos Colegas do 9ºB Vizela
(sempre ao correr da pena e no meio de muito barulho)
   A vossa carta vai transformar este domingo num dia especial, pois já há muito tempo que não recebo correspondência privada. O dia não é o mais indicado porque tenho a casa cheia de barulho com netos que vão dos 3 anos aos 12 e por isso é difícil concentração com este ruído. Mas assim também não há assunto especial para tratar, está tudo bem.
   Vamos falar da minha ida aí. Gostei, gostei muito, pois isto de sair da minha "roda" tem um sabor especial. Imaginai-vos na minha idade; dias, dias, semanas, meses sem haver nada de novo e, de repente, ver-me assim num meio em que eu sou a "única". Tudo o mais é juventude, alegria, conversas desajustadas, mas tudo bem afinado, tudo no mesmo tom e dentro do nosso tema. Mas a "única" com uma diferença de 3/4 de gerações e que nem me lembro disso! Parece-me que estou numa aula própria em que não há professores e eu sou tão aluna como vós. Não é fácil imaginardes o que eu senti, pois digo-vos que é, foi, inesquecível. Quando me deitei ainda me julgava num recreio com muitos e muitos colegas em conversa sem nexo.  Durante horas não me senti sozinha, mas com aqueles e aquelas colegas dos anos 40, por isso há mais de 60 anos num colégio onde havia ordem, respeito, mas também muita, muita juventude e, como tal, muita irreverência. Fez-me relembrar os anos tão distantes em que tinha as minhas amizades preferidas, mas onde havia para com todos muito carinho, muita dedicação, que relembrada ao fim de tantos anos, fazem vir as lágrimas aos olhos pela recordação e saudade daqueles (e tantos) que já não estão connosco. Na minha idade é de louvar, agradecer a Deus, esta felicidade, esta presença. E não deixo de agradecer e simultaneamente pedir que todos os jovens de hoje possam ter uma vivência como eu tive. Dá para recordar tempos difíceis, porque os atravessei, (recordando tempos de guerra na Europa - nós felizmente estamos em paz), tempos de fome e atraso mental e cívico, mas fica sempre um espaço para reconhecer que valeu a pena tudo que de mau se viveu. O resultado foi positivo.  O que de bom havia, superava todas as dificuldades. Como é bom recordar numa vida tão longa, tão longa como a que estou a viver e entretanto, entrecruzar-me com grupos jovens como vós como é agradável, com deixa um sentido de felicidade e satisfação por estas oportunidades fugidias que dão horas e horas de prazer ao recordar os bons velhos tempos!!!
   Amigos acreditai que se vos pareci uma pessoa bem disposta, só vistes e apreciastes o que realmente sou: uma velha (90 anos) que não sente essa idade e que muitas vezes consegue deslocar-se na vida dezenas de anos atrás e ser a pessoa que tiveram ocasião de conhecer. Mas não esqueço a realidade... o que me dá vontade de vos voltar a ver qualquer dia. 
   Por hoje, um grande abraço que abrace todos (desculpem os atropelos neste abraço).
   A amiga,
   Carolina

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